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♣ O MELHOR DOS CONTOS QUE ESCUTAMOS....

Os nossos reeencontrosformas de reviver o espaço construído e vivido na nossa adolescência onde, há algumas dezenas de anos, subvertendo tradições e lutando contra os constrangimentos, exercemos a rebarbatividade com irreverência em busca de libertação, de companheirismo e de formas sonhadas e sonhadoras de             viver que, ainda hoje, marcam a nossa existência.
Efectivamente aconteceram, por estas alturas, como resultado do nosso convívio, das nossas "patifarias", da acção dos Tralhas, dos Tó-Pintos, dos Piriscas, das Ofélias, dos Ramalhos e dos senhores Fonsecas, momentos importantes e inesquecíveis da nossa socialização.
Não é portanto de estranhar que com o aproximar deste nosso NOSSO  REENCONTRO  com a excitação mal contida e a emoção manifesta, sejam o resultado dos momentos que adivinhamos ir viver:
- Abraços fraternos e beijos amigos a espalhar pelos Armandos, Eliseus, Manéis, Luízes, Norbertos, Antónios, Pedros, Joões, Marias, Luisas, Anas, Isabeis, Manelas, .... etc, etc.
- Relembrar as histórias brilhantes que protagonizámos e permanecem intactas nas nossas memórias, enquanto devoramos adolescentemente os petiscos e avidamente a inebriante pinga.
-Viver momentos lindos onde acontecerá a gargalhada libertadora, a cumplicidade de recordar e a comoção inevitável, ao fim e ao cabo, apanágio destes NOSSO REENCONTRO.
Como disse o Torga: « a velhice é isto: ou se chora sem motivo, ou ficam os olhos secos de lucidez.»
Serão dias nossos, dias que contribuirão para reforçar o espírito do GRUPO e acentuar as marcas já interiorizadas no passado. DIAS certamente muito bonitos e transbordantes de QUERER para que e até sempre aconteçam dias desses.
Luis Mário Cunha
(ex-dux veteranorum)


«O melhor dos contos que escutamos, o melhor de todo o verdadeiro amor, dos mais belos episódios da vida, consiste talvez em revivê-los, em retomar aquilo que passámos, muito tempo depois, contemplando bastante de longe o passado, as realidades desprendidas de toda a sob rescrição que as rodeava. Como a alma adora planar entre essas recordações!» (...) « os cantos mais fortes e mais doces, ainda não foram cantados.»  (Walt Whitman)


♣ UMA SINGELA EVOCAÇÃO

Sabe-me bem por vezes, descer às profundezas da memória e demorar-me em imagens, que permanecem vivas, do verão de 67.
Na Guarda, Junho era quase sempre um mês já escaldante em seus calores estivais e também o foi naquele longínquo ano que, por ser de exame deu direito a fato novo, de tecido pesado, pois fato que se prezasse, o dono haveria de albardar por todas as santíssimas quatro estações.
E foi assim bem enfarpelados que no primeiro dia dos exames nacionais, nos fomos aglomerando cheios de ansiedade, à porta do Liceu:
- Ena tanta gente!
- Esconde o cigarro que a tua mãe está a olhar para ti”
- Ali a M…. está boa c´mó milho!
- Esta noite nem preguei olho!
- Nunca mais toca a porra da campainha!
- Se calhar um texto do Herculano, ainda me safo na Literatura!
Estas eram algumas das bocas que ressoavam naquele babel de sentimentos e emoções antes do inicio das provas escritas que seriam, afinal, o tiro de partida para a nossa dispersão, uns directamente para o mundo do trabalho, outros a caminho das três cidades universitárias que então existiam, com Coimbra quase sempre a levar a palma.
Gradualmente fomo-nos perdendo segundo os acasos da vida que alguns, felizmente poucos (lembro com saudade o Zé Alberto Capelo), nem tiveram oportunidade de construir.
A máquina do tempo foi rodando. A uns cobrou o tributo de servir na guerra, tolhendo-lhes ou retardando-lhes a definição de um rumo e a outros terá cobrado as lágrimas vertidas em momentos de solidão ou de saudade dos tempos que não voltam. Mas finalmente de todos fez cidadãos de corpo inteiro e pais e mães embevecidos dos rebentos com que contribuímos para os alicerces do futuro.
1992 foi o inicio do nosso reencontro. Recordo a ansiedade à medida à medida que íamos chegando, tentávamos identificar os rostos a que pudéssemos devolver os nomes que conservávamos na memória! E logo que o conseguíamos, com naturalidade se reavivavam, como se tivesses ocorrido ontem, episódios daqueles tempos difíceis mas também inebriantes da mocidade perdida.
Pode dizer-se que os nossos encontros estão agora institucionalizados. E, depois de transcorridos tantos anos, é gratificante constatar que não rejeitámos aquela paisagem serrana, agreste e granítica, que para sempre nos moldou a alma, para, com coragem enfrentarmos a adversidade, com alegria desfrutarmos os momentos em que a vida nos sorri, e sem acanhamentos pu vedetismos, nos respeitarmos na nossa diversidade e assim nos misturarmos, como iguais, nestes momentos de confraternização que todos desejamos que se repitam por muitos e muitos anos.

João Gonçalves Marques

  Maio 2000

♣ O ENCONTRO ANUAL DA MALTA

Atingidos os “entas” a curva da vida inverte e nós, os humanos que até ali éramos os reis do mundo”amaciamos”.
Numa primeira fase, chegados a um patamar da escadaria (quase sempre coincidente com a estabilidade material e profissional e com filhos já senhores do seu nariz) descansamos o que nos possibilita, sem querermos ou sequer disso termos conhecimento, as primeiras interrogações acerca da infinidade da escada que temos vindo a subir e do real valor dos prémios que o nosso ego espera ir conquistando nessa ascensão.
 Pé ante pé, difusa, uma certa dúvida existencial começa a instalar-se na nossa vida.
Recuperadas as forças, reatamos a subida.
Mas onde está a anterior ligeireza?
Os músculos estão cansados e as nuvens escondem agora a parte superior da escada. Começamos como que a ter frio e a necessidade de parar amiúde.
Curiosamente, apesar de sempre ter estado aí, só agora reparamos que ao nosso lado há muita gente, parte da qual conhecemos lá em baixo naquela fase difícil em que tivemos que atravessar montes, rios e outros obstáculos antes de iniciarmos a subida.
É gente com a qual tínhamos tanto em comum, como era os sonhos que alimentavam as nossas vidas.
Olhamo-nos e de imediato reempatizamos, apesar das diferenças, damo-nos conta que somos muito iguais: os corpos igualmente marcados pelo tempo; idêntica a rapidez das vidas; os mesmos sonhos, paixões, preocupações, ambições, etc.
E toda esta similitude, independentemente das voltas que demos, das profissões que temos e da dimensão das nossas contas bancárias.
É obra!
Por isso nos sentimos bem quando nos juntamos. É certo que estamos numa escada: as vidas são separadas e é preciso prosseguir a subida, mas os patamares agora sabem tão bem ….
Aí, pelo menos, não temos necessidade de lutar e cada vez mais nos vamos dando conta que a amizade é senão o maior, um dos principais valores da vida.
E que amizades mais belas que aquelas que vêm da época mais pura, simples e realista da nossa existência?
Por tudo isto um muito obrigado aos que este ano estão a organizar o encontro.
Por experiência sei o muito trabalho que dá, mas, creiam-me os próximos, é mais recompensado pela alegria de o termos feito.
Eliseu G. Fernandes
Mafra, 20 de Maio de 2000



♣ A GUARDA e as SUAS TRADIÇÕES ACADÉMICAS

Pedem-me que escreva algumas palavras sobre as Tradições Académicas que preenchiam o quotidiano da nossa vida estudantil nos anos de juventude, nesses tempos que levámos até à conclusão do curso liceal.
Tentarei pois relembrar este tema já que mesmo não sendo um “praxista afamado”, pelo menos tentava ser seguidor das regras que as determinavam.
Cumpre assim dizer que a Guarda era de facto um bastião de praxes, rituais e actividades de índole Académica que a tornavam impar em comparação com outras cidades onde o limite dos estudos que se podiam atingir era similar.
Daí que, pelo menos aqueles que após a conclusão do curso liceal optaram por ir estudar para Coimbra, tenham encontrado menos dificuldades na sua adaptação à praxe coimbrã, porque a vivência da mesma, nas nossas escolas era já muito similar.
Em primeiro lugar havia o traje Académico.
Já usávamos, no todo, a velha capa e batina, e cumpríamos todos os rigores a que o bem vestir esta indumentária obrigavam.
E tínhamos “as troupes” que recebiam os caloiros que vinham chegando das povoações em redor da Guarda, e que, de uma forma suave ajudavam à sua integração na vida estudantil, já que eram muitas as novidades que o Liceu lhes aportava.
Tínhamos também as serenatas e a Queima das Fitas dos Finalistas que iam cumprindo, ano a ano, o “sétimo” de todos os sonhos.
E havia o nosso “Dux Veteranorum”.
A ele competia zelar pelo bom cumprimento das regras e praxes académicas e resguardar o bom nome da Academia por forma a que essas Tradições se mantivessem intactas.
O Dux era tido como boémio, e o mais “vadio” de todos nus (ressalve-se que na nossa terra a palavra “vadio” não tem a mesma conotação pejorativa que, em muitas regiões do nosso país, pois está associada a um individuo de mau carácter.
Aliás a população estudantil apenas o via como alguém não cumpridor das regras da “Sociedade Futrica”, ou seja um pouco rebelde e contestatário.
Nós sabíamos que não era assim, que o seu coração era grande e albergava “todos os amigos do mundo”. E como lá podiam caber tantos!...
O Dux era o nosso deus, o maior e o melhor de nós todos, aquele que fazia os impossíveis e até milagres que tanto nos espantavam.
Mas que também podia chorar (porque só os Grandes Homens o sabem fazer) nas horas boas e más porque tínhamos de passar.
Por isso nos orgulhávamos dele.
Sabíamos que ali estava o “Guardião das Tradições Académicas” e que por isso as mesmas jamais podiam morrer.
A Escola e os Mestres faziam de nós gente pronta a construir “os sonhos com que sonhávamos”.
Mas, a Tradição Académica e o nosso Dux, acabavam também por nos moldar o carácter, nessa plêiade de sentimentos que em nós hão-de perdurar como são a amizade, o sentido de humanidade e a solidariedade. Por isso, nós, os da Guarda, continuamos a ter a Nobreza, Orgulho e Grandeza de Alma que fazem tão rica a nossa Academia, sentimentos esses que, mesmo na voracidade dos tempos, continuam a ser apanágio de quem ali nasceu e estudou.
José César Pereira – Finalista 65/66

in «Ó da Guarda» editado no Encontro Nacional de Mafra.(20-06-1998)